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O controverso tarô


O tarô é uma criação europeia. As mais antigas referências documentais foram encontradas na cidade italiana de Ferrara e datam de 1442.
O mais antigo exemplar de um baralho de tarô existente atualmente foi produzido em Milão, e supõe-se que tenha sido fabricado em 1441. Pouco mais de 60 anos antes estão registradas as primeiras referências à existência de cartas de jogar na Europa.
Saiba mais sobre as “Origens do baralho”.
Coube aos europeus acrescentar 22 cartas a composição dos pioneiros jogos de cartas europeus, já então populares no norte da Itália.
Nestas cartas foram utilizadas imagens com a iconografia popular típica da época, cujas alegorias eram extensivamente usadas na ilustração de livros e na ornamentação arquitetônica.
A função destas cartas adicionais – designadas por trunfos – é a de superar qualquer carta normal jogada na mesma mão, na disputa de cada uma das rodadas de jogos de vasas, classe de jogos cuja estrutura é a mesma do atual jogo de bridge, e que seguem a estrutura dos originais jogos praticados pelos mamelucos.
Durante o século XV os jogos praticados com este novo tipo de baralho eram denominados carte da trionfi, e as cartas adicionadas, trionfi.
Estes termos indicavam claramente o objetivo destas cartas que era o de prevalecer, superar, ganhar... triunfar sobre outras cartas jogadas em cada mão.
No século XVI o jogo usando baralhos com trionfi passou a ser designado por tarocco e as cartas usadas por tarocchi. A origem do termo é desconhecida, especulando-se que possa ter sido originado do francês tarot ou tarau, como algumas referências citam.
Os primeiros trunfos criados não eram numerados, nem continham legendas: a identificação de cada carta era feita exclusivamente por sua imagem. A numeração e designação dos trunfos parecem ter sido inventadas durante o século XVIII, na França.
Após a sua criação no norte da Itália, o jogo de tarô, e as respectivas cartas usadas para sua prática, espalharam-se para a Suíça, sul da França, Alemanha e Áustria, mas não chegaram à Inglaterra e à península Ibérica.
Assim, perderam o barco que levaria este jogo para o Novo Mundo, tornando-o desconhecido em países de línguas inglesa e espanhola, onde apenas sua utilização esotérica é conhecida e praticada.
Especula-se que, se isto tivesse ocorrido, o jogo de tarô poderia ser atualmente mais famoso e conhecido que os jogos de bridge (que é seu descendente) e poker.
Os desenhos usados tanto nas cartas “normais” como nos trunfos foram sendo gradualmente modificados, adequando-os ao gosto e a iconografia popular das regiões em que chegavam.
Baralhos de tarô austríacos, por exemplo, são ilustrados com cenas rurais típicas daquela região durante os séculos XVIII e XIX, abandonando-se completamente a simbologia originalmente concebida para os trunfos dos primeiros tarôs italianos, popularizada posteriormente pelo tarô de Marselha, e usada para fins esotéricos.
O tarô oculto
A utilização do tarô como instrumento de adivinhação e previsão do futuro é bem posterior à criação deste baralho e dos jogos que com ele se praticam.
Seu desenvolvimento original coube, principalmente, a Jean-Baptiste Alliette, que se autodenominou Etteilla, usando um anagrama de seu sobrenome.
Este francês publicou em 1770 um livro no qual expõe a maneira de ler o futuro usando um baralho de 32 cartas, popular à época para o jogo de Piquet. Note-se que o método ainda não fazia referência ao tarô, praticamente desconhecido na região de Paris, à época.
Foi então que Antoine Court de Gébelin, pastor protestante de origem francesa, publicou sua obra Monde primitif, em nove volumes, entre 1773 e 1782. Gébelin sugere a associação simbólica das figuras do tarô com o misticismo do antigo Egito, mas não se refere à utilização do tarô com propósitos adivinhatórios.
Sua obra inspirou Etteilla a usar este baralho associado ao seu método de previsão do futuro. Seu agudo espírito comercial popularizou durante vários anos a utilização do tarô como instrumento místico, tornando Etteilla o grande cartomante da época.
O hábito de adivinhação com baralhos sejam tarôs ou não, sofreu um gradual desgaste no final do século XIX, tendendo a cair em completo esquecimento, ou a se tornar apenas um divertimento de salão, sem nenhuma ligação com o ocultismo e seus desdobramentos.
Foi nesse período que outro francês, nascido Alphonse-Louis Constant, que se auto denominava Éliphas Lévi, passou a reviver o ocultismo da condição decadente em que se encontrava.
Seguidores de Éliphas Lévi, muitas vezes ainda usando Court de Gébelin como referência, desenvolveram o tema, mantendo o mito da leitura de sorte com cartas presentes até nossos dias.
As ideias esotéricas francesas ligadas ao tarô tiveram uma importante repercussão na Inglaterra, cultivadas por importantes movimentos ocultistas como o Golden Dawn, iniciado em 1887.
Dalí desdobraram-se naturalmente para as colônias nos Estados Unidos, onde verificam-se vários autores e desenhistas de tarôs especialmente concebidos para fins esotéricos.
O fato do tarô como jogo não ter chegado à Inglaterra, e por consequência também ser desconhecido nos Estados Unidos, foi a razão deste fantástico jogo de cartas ser, nestes países, apenas um instrumento de adivinhação, enquanto em várias regiões da Europa ainda seja entendido, primordialmente, como um jogo popular, tradicional e inteligente com cartas.
A discussão sobre a veracidade do uso do tarô em experiências de previsão foge ao escopo deste artigo. Cabe, apenas, lembrar e destacar a origem lúdica deste baralho especial.
Por José Luiz Giorgi Pagliari e Cláudio Décourt